Recentemente eu tenho me engajado em algumas pesquisas, a maioria delas por obrigação, já que parece que eu tenho que pesquisar pra todas as matérias, todos os semestres, toda a minha vida, na faculdade.
Um em especial me chamou a atenção.
Não é exatamente uma pesquisa, mas eu posso garantir que para o resultado final houve uma extensa pesquisa bibliográfica e inúmeras horas de aulas massantes de psicologia social II (mentira). Não que eu não gostasse das aulas, até porque elas realmente me fazem refletir, mas, no fundo no fundo, parece que tudo aquilo já estava dentro de mim. Sem contar as inúmeras vezes que eu tive que ouvir umas opiniões absurdamente conservadores ou sem nexo nenhum. (E por mais que você pense que a faculdade de psicologia é um bando de pós adolescentes liberais, hippies, fumadores de maconha - o que certamente alguns são - isso não é verdade. Tão longe de ser verdade...)
Isso me faz pensar como eu devo ser uma pessoa abençoada pela cabeça que eu tenho, no melhor dos sentidos. O que me fez pensar também o quanto a vida acadêmica pode ser uma grande mentira, mais um meio de produção de pessoas.
Talvez por isso eu gostasse mais dos velhos tempos, acho que as pessoas eram mais instintivas ou inocentes, sei lá.
MAS, voltando ao assunto, esse trabalho eu fiz com uma grande parceira minha desde o primeiro período da faculdade (Sei que no início só andamos juntas por interesse, mas acho que acabamos nos tornando um bela dupla ahsuasuha).
E sobre o que é esse trabalho? Isso mesmo: papéis de gênero.
Eu nunca vi um assunto ter sido tão largamente discutido durante, pelo menos, uns dois anos? É possível ver esse tipo de transição, principalmente se você é um usuário avido das redes sociais (a.k.a Facebook), quando toneladas de post relacionados ao feminismo ou "anarcomiguxos", "feminazis" e suas variações, tomam conta do seu feed de notícias.
Não que eu ache isso ruim, mas como qualquer coisa, as vezes as pessoas levam a ideia longe demais.
Enfim, no trabalho era pedido para fazer um paralelo entre um filme infantil de nossa escolha e os textos e aulas referentes a gênero pautados.
Escolhemos o filme "A Ratinha Valente", um filme que provavelmente você não se lembra, ou se lembra, você realmente é uma pessoa de boa memória, porque a única coisa que eu lembrava do filme era da ilustração do poster.
Depois de de dois dias de leitura avida, analise de cenas e palavras escolhidas a dedo por nós, eis o resultado final:
"
Questão
de Gênero tratado em base do filme “A Ratinha Valente”
Nas
últimas décadas, é possível observar um crescente interesse nos
estudos de identidade e gênero, tendo em vista que diversos
estudiosos/as, principalmente feministas, tem buscado analisar e
problematizar questões de sexismo que permeiam na sociedade.
Desde
antigos movimentos como a luta para o fim de casamentos arranjados e
a conquista de igualdade contratual entre homens e mulheres no fim do
século XIX até os mais recentes como a “Marcha das Vadias” e a
busca da maior representatividade das mulheres na política, o
feminismo tem mostrado sua influência para alterar o modo as pessoas
percebem e veem questões de gênero na atualidade.
Se
pararmos para analisar, é quase impossível não se deparar com o
impacto do sexismo e dos chamados papéis de gênero em nosso modo de
vida. Em pequenos detalhes, que muitas vezes não percebemos a
primeira vista, há o enraizamento do pensamento de que o ser humano
hétero, branco e masculino é o padrão de normalidade humana, e
qualquer variação disso é considerada desviante.
Como
é explanado no texto de Guacira Lopes Louro (Gênero, sexualidade
e educação – uma perspectiva pós-estruturalista;
Vozes, 2003), essa padronização já é evidente desde os
primeiros anos de vida, quando é posto que há “brinquedos de
menina” e “brinquedos de menino”,ou que azul é “para
meninos” e rosa “para meninas”, e essa diferenciação é
institucionalizada dentro das escolas, onde meninos e meninas são
separados nas filas, os esportes na aula de educação são
diferentes pois há uma crença na “debilidade física” das
meninas em relação aos meninos, e até mesmo como os/as
professores/as tratam esses/as alunos/as, pondo que meninas que tem
um bom rendimento escolar são consideradas esforçadas e não
inteligentes, já os meninos com baixo rendimento são considerados
desatentos ou agitados, porém sua inteligência nunca é
questionada, de tal forma que passamos a crer que essa diferenciação
é um fato natural e não cultural.
O
sexismo e os papéis de gênero são largamente notórios na mídia,
como filmes, quadrinhos, músicas, programas de TV, etc. Tendo isso
em vista, procuramos analisar de forma crítica e minuciosa a
presença desses fenômenos no filme “A Ratinha
Valente”(1982).
O
filme conta a história de Sra. Brisby, uma ratinha viúva em sua
luta para mover sua residência para um local seguro do arado, já
que seu filho está com pneumonia.
Com
o tema de nosso estudo em mente, a primeira coisa que podemos notar é
que sra.
Brisby
não é o típico herói: masculino e viril; ela transparece uma
imagem de fragilidade e delicadeza, ela é uma mãe, dona de casa,
cujo o único desejo é o bem-estar de sua família. A imagem do
herói é antiga, e está enraizada em nosso imaginário como
um
homem superior (branco e hétero),admirado por todos. Outro ponto
muito marcante é o fato de não sabemos o nome de nossa
protagonista, que sempre é referida como sra. Brisby ou sra.
Johnantan Brisby, seu falecido marido. A ratinha só obtêm respeito
e reconhecimento dos outros ratos pelo legado de seu cônjuge. Antes
de
saberem
que ela tinha uma relação com um antigo e respeitado conhecido,
sra. Brisby era tratada com desdém pelos outros ratos. Seu valor só
lhe é conferido a partir da ligação com essa figura masculina, e
não por seu próprio mérito. Isso contempla o mito de que a mulher
seria uma continuação do homem, ou um homem incompleto. Apesar de
estar clara o valor de sra. Brisby para o espectador, ao final da
história é inegável que sua odisseia é guiada pelos homens de sua
vida: o filho que está doente, os ratos que conhece e o legado de
seu marido, e não por seus próprios desejos e ambições. Jamais
sabemos
algo sobre a vida de sra. Brisby senão como mãe e esposa.
No
filme nos é apresentada uma sociedade de ratos com uma inteligência
superior ao de outros animais, no entanto, tal sociedade é
exclusivamente composta por homens, reforçando a ideia de que homens
tem uma maior capacidade intelectual do que as mulheres. É
importante ressaltar que os principais líderes da história são
homens
(Nicodemus
e a Grande Coruja), colocando-os mais uma vez em uma relação de
superioridade com as mulheres.
A
partir de nossa análise crítica, também podemos observar que todas
as personagens femininas são representadas dentro de um ambiente
doméstico, com tia Megera, a sra. Brisby e suas filhas, o que remete
que o gênero feminino apenas se coloca nesse ambiente doméstico. Os
homens são apresentados como os “resolvedores de problemas”
enquanto as mulheres se limitam a cuidar do lar.
Ainda
dentro desse ambiente doméstico é possível perceber uma gritante
diferenciação entre o filho mais velho de Sra. Brisby e suas irmãs.
Ele se mostra um menino muito agitado, por vezes rebelde, ressaltando
que é corajoso e valente, muito diferente de suas irmãs, que são
vistas como mais “recatadas”, comportadas. Isso é um claro
esteriótipo criado pela mídia, onde meninas devem ser educadas e
quietas e meninos devem exibir desde muito cedo que tem virilidade,
onde eles não podem ter medo, ou chorar, “como uma
garotinha”,mostrando fragilidade.
Isso
são algumas coisas que pudemos observar em uma visão geral do
filme.
Pensando
em nossa própria vivência, as questões de gênero foram mostradas
desde nossa entrada nas instituições de ensino, como já foi
citado, na separação em filas, da separação também na educação
física, em alguns casos também onde o uniforme era diferenciado:
meninos de short e meninas de saia; professores/as que julgavam
inadequados os brinquedos levados por meninas como bolinhas de gude,
onde era dito que isso era “coisa de menino”; quando meninas eram
mais agitadas muitas das vezes eram comparadas com meninos.
Dentro
de casa, o sexismo também é evidente. Os filhos normalmente tem
mais liberdade sexual do que as meninas. Quando o filho perde a
virgindade por exemplo, é motivo de orgulho, e em contrapartida
quando a menina faz o mesmo, é duramente julgada pelos pais.
Acreditamos que isso gera uma grande frustração por parte das
mulheres, e é possível notar isso em vários fatos cotidianos de
nossa vida.
Tanto
mulheres quanto homens são constantemente analisados pelo que
vestem: quando a mulher usam roupas mais masculinas é tachada de
“sapatão”, ou quando usam roupas mais justas ou apertadas, são
“vadias”. Isso também é observável nos homens, que usarem
roupas mais justas, são chamados de “viados”.
Este
é só um dos exemplos que estão presentes de forma marcante em
nosso dia a dia, sem contar com a diferenciação de salários e
cargos; representação política; os altos níveis de violência
baseados em gênero; a constante cobrança para que a mulher tenha um
“corpo perfeito”; piadas sobre como mulheres dirigem mal e de
cunho semelhante; a associação que elas tem ao seu sucesso com um
homem (ela deve namorar um homem para obter sucesso); a ideia de que
“o homem deve pagar a conta”; a expectativa posta em cima das
mulheres que elas devem ser uma boa esposa e mãe no futuro,
independente de seus desejos, entre outros incontáveis exemplos.
A
psicologia social tem o papel de identificar esses papéis de gênero,
analisá-los criticamente, buscar sua origem, compreendê-los e
desconstruí-los, questioná-los, para que haja uma reflexão
constante de nossas atitudes e de outrem, para promover uma sociedade
cada dia mais consciente e igualitária. A realização de estudos
sobre o tema é apenas um dos meios que podemos utilizar como
psicólogos para o aprimoramento e divulgação dessa questão.
Tendo
em vista a nossa formação, acreditamos que podemos construir, mesmo
que a curtos passos, uma sociedade menos baseado no sexismo, fazendo
com que as pessoas reflitam sobre o papel delas dentro desse
contexto. Fazendo com que as pessoas aceitem suas diferenças, não
como um desvio, mas como uma pluralidade, que faz parte da
diversidade natural do ser humano. O constante debate e reflexão
sobre o assunto é de extrema importante, pois, como bem enfatizamos
em nosso texto, o sexismo ainda é um aspecto de muito peso dentro da
comunidade."
Pois bem. Aqui me despeço de vocês, espero que tenham apreciado o post e o trabalho.
Auf Wiedersehen!
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